A BANDA DA SEMANA DO PAULO ANDRÉ (Reloaded) – MOTHER ABYSS

Sou daqueles que não acredita que a galinha do vizinho seja melhor que a minha só porque sim. E por isso penso que, pelo menos no que à música diz respeito, Portugal não sofre de nenhum handicap implícito em relação a qualquer outro país, região ou cultura. A prova disso é que não param de surgir novos projectos, muitos deles com uma maturidade desde logo uns furos acima da média. E os dedos começam a não chegar para contar aqueles que conseguem de forma sustentada dar o salto e para os quais o país começa efectivamente a ser pequeno, no melhor dos sentidos. Ainda assim, entre o regresso desta rubrica e a sua aparição inicial nos primeiros três meses deste ano, já lá vão catorze edições… e nem uma banda nacional para amostra. Contrasenso? Talvez. Preconceito? Nenhum.

Chega, pois, com naturalidade o momento de resolver essa questão e esse é um “fardo” que cabe aos Mother Abyss, naturais de Viana do Castelo e cujo curto tempo de vida é inversamente proporcional aos elogios de que têm sido alvo desde que se formaram em finais de 2012. Apesar da juventude dos seus quatro membros, passagens por bandas anteriores como os Burning Man ou os The Walking Dead conferiram-lhes uma quota de experiência que cedo se revela no único trabalho editado até agora, o EP «Burden», um estudo do riff que durante pouco menos de meia hora se move de forma etérea pelos meandros alargados do post-metal, com ecos de Zozobra e Cult Of Luna. O riff hipnótico que invade «The King», o despojo emocional dos acordes soltos de «The Ritual», o interlúdio psicadélico de «The Killer» ou o hardcore deliberado de «O Fim da História e o Último Homem» não mostram (ainda) particular originalidade mas empolgam pelo potencial que deixam antever e sobretudo pelas emoções que provocam a cada momento.

Recentemente conversei com o baixista e vocalista, André Gonçalves, que de forma esclarecida e assertiva me falou sobre a formação e motivação da banda, a sua forma de funcionar e de encarar a própria música. E será ainda possível ser, hoje em dia, completamente original?

Os Mother Abyss são uma banda muito recente mas enquanto músicos vocês já não andam nisto há dois dias. Conta-me um pouco do vosso background e de como surgiu a motivação para formar os Mother Abyss.
Mother Abyss surgiu como um projecto paralelo a Burning Man em finais de 2012. The Walking Dead tinha acabado e o João estava parado. Decidimos ensaiar com ele e ver até que ponto um segundo projecto se justificava. Queríamos algo diferente do que tínhamos feito até então. Logo percebemos que nos dávamos muito bem musicalmente e partilhávamos das mesmas influências e objectivos. Posteriormente convidámos o Nuno para a segunda guitarra, e foi uma escolha óbvia pois já tínhamos tocado com ele e sabíamos que era a peça que faltava.

Como definem a vossa música? A vocalização que ouvimos no «Burden» soa bastante Cult Of Luna – uma influência, de resto, assumida por vós – mas instrumentalmente de onde vem a inspiração para os riffs contidos neste EP, bem como das secções mais ambientais como o interlúdio da «The Killer»?

Penso que instrumentalmente se denotam várias influências que temos já há algum tempo, tais como Mastodon, Cave In ou Neurosis, por exemplo. O interlúdio da The Killer acabou por se tornar, em conjunto com o final da música, numa “homenagem” a muitos riffs que Neurosis criam e que são grande fonte de inspiração para nós.

A capa do «Burden» é estranhamente apelativa. Existe um conceito subjacente ao disco? De forma mais abstracta, há um objectivo último e concreto no horizonte da banda?
A capa do disco foi feita pela Raquel Peixoto, à qual agradecemos todo o seu trabalho. «Burden» é conceptual e retrata um romance trágico, uma história real onde impera o drama e desespero. Tentamos que fosse, mais que um disco, uma experiência.

Como funcionam os Mother Abyss em termos de composição e abordagem à gravação? Temos um proverbial mastermind na banda ou funcionam de forma totalmente cooperativa e orgânica?
O nosso processo criativo passa por ensaiarmos juntos. Os riffs saiem na hora e a estrutura é moldada à medida que vamos construindo a música. Cooperamos todos e tentamos sempre fazer pré-produção do nosso trabalho para entrar em estúdio com o trabalho de casa feito. Deixa-nos mais tempo para detalhes e tentar chegar ao som desejado.

Até que ponto acham, neste tipo de sonoridade, que é possível produzir algo de realmente novo e inovador? Estaremos a chegar a um ponto em que se torna particularmente complicado fazer música que vá além de ser mais uma variação de algo que já se ouviu antes? De que forma é que os Mother Abyss encaram isto ou simplesmente não é uma preocupação?
Não nos preocupamos com isso. Inevitavelmente somos influenciados por várias bandas. Mas as melodias e estruturas das nossas músicas são feitas de uma forma natural sem tentar copiar algo que já tenha sido feito. É aquilo que sentimos no momento. É fácil cair na tentação de seguir os caminhos já percorridos, mas isso é algo que não nos atrai. Sobretudo quando uma música é longa e criativa, a probabilidade de outra banda ter uma estrutura igual é pequena. Começámos esta banda com o objectivo de fazer algo diferente, sobretudo em Portugal, e disco após disco queremos mostrar exactamente isso.

O que podemos esperar dos Mother Abyss nos próximos tempos? Já têm planos para um longa-duração?
Estamos a acabar a apresentação do EP e temos mais duas datas até ao final do ano. Temos planeadas umas novidades. Fiquem atentos.

E já agora… cinco disquinhos que vos andem a consumir nos últimos tempos?
Pelican – Forever Becoming
Deafheaven – Sunbather
Omega Massif – Karpatia
Downfall of Gaia – In the Hearts of Emperors
Melvins – Tres Cabrones

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