Não há nada que justifique o facto de estarmos em 2018 e ainda haver tanta gente que não percebe que as mulheres são perfeitamente capazes de respeitar ou apreciar a arte feita por homens sem os desejarem sexualmente. Ou que nem todas as mulheres têm a fantasia de “comer” uma estrela de rock. Só a suposição de que o rock, e especialmente o heavy metal, são masculinos demais para as mulheres – e que, por isso, a única razão para estarem num concerto ou quererem conhecer um músico nos bastidores é “quererem mais qualquer coisa” – é quase tão parva com o facto de alguém como a Tarja Turunen ainda ter de enfrentar a previsível questão da “mulher numa banda” em muitas das entrevistas que faz. Sim, em número as mulheres são superadas em larga escala pelos homens no universo do metal; sim, o metal é rápido e agressivo, mas isso não significa que não possa atrair mulheres. Seja no palco, à frente dele ou no mosh pit, as mulheres têm todo o direito de estar neste meio – e não têm nada a provar a ninguém.
Durante muito anos, a mensagem dos metaleiros para o sexo feminino foi de atribuições: “podes ser groupie, mas não uma fã ou músico sério”. Isso fez com que passassem a ser vistas como meros adereços vivos numa atmosfera ao estilo Hooters; e, mesmo que não haja nada de errado na ideia de mulheres de biquíni, há algo profundamente triste quando esse é o único papel que o metal lhes permite desempenhar. Caramba, vamos manter em mente que estamos em 2018. Sabemos todos que o sexo vende, em todos os quadrantes da nossa sociedade – e, na indústria musical, até já foi uma espécie de garantia de sucesso. Não é, por isso mesmo, estranho que haja mulheres no heavy metal que usam mais que a sua voz para tentar vencer no meio – In This Moment e Butcher Babies, estamos a olhar para vocês. E sim, uma abordagem do estilo não ajuda nada a normalizar a presença feminina, mas essas são as excepções à regra e, verdade seja dita, ninguém as parece levar muito a sério.
Hoje, neste e noutros meios, não é – nunca foi! – justo as mulheres terem de vestir pouca roupa ou trabalharem a dobrar para conseguirem um reconhecimento ao nível dos seus pares masculinos. E, no que toca a isso, muitas mentalidades precisam de levar um proverbial chuto no rabo que já só peca por tardio. Os temas líricos, a luta contra o poder estabelecido – irónico, não é? “practice what you fucking preach!”, berravam os Napalm Death nos idos dos 80s – podem e devem prevalecer; as estruturas musicais base não são sequer negociáveis, mas a exclusão – de mulheres ou seja de quem for – precisa mesmo de ser recalculada. Caso contrário, se o metal e o rock não se moldarem para reflectir o seu público cada vez mais diversificado, podem vir a tornar-se irrelevantes de vez. Portanto, caso achem que vale mesmo a pena continuar a perpetuar ideias bacocas, tenham em mente que, continuando assim, em 50 anos não vão sequer ter uma “cena”.
A versão integral deste texto foi publicada na LOUD! de Agosto de 2018.