AQUELA VERSÃO #33: AEROSMITH vs. THE BEATLES

THE BEATLES são uma referência na história do rock e da pop. Muitos também consideram que nos seus últimos discos reside a chave para aquilo que mais tarde seria o hard rock mas, divagações filosóficas à parte, o quarteto sempre foi um nome apreciado pelo rock mais musculado e mesmo pelo hard rock tradicional. «Come Together» é, sem dúvida, um dos temas que mais incorpora elementos passíveis de serem extrapolados no ambiente do hard rock, ao mesmo tempo que a letra possui dualidade suficiente para agradar aos letristas na área. Integrando o álbum «Abbey Road», de 1969, o tema é da “autoria” de John Lennon. Tudo resulta do activismo político em que John e Yoko começavam a embarcar. Uma movimentação anti-Reagan, quando este era governador da California, com a participação de Timothy Leary, deu o mote para a escrita do tema. Leary era, à época, activista pró-drogas, sendo o guru do uso de LSD. Amigo de Lennon, chegaria mesmo a partilhar, junto com a esposa, a cama do casal no evento pacifista bed-in. O tema, já da fase final do quarteto de Liverpool, acabaria, assim, a ficar ligado aos primeiros anos a solo de Lennon.

As aspas em “autoria” devem-se à polémica que se seguiu, pois o rocker Chuck Berry acusou Lennon de plágio. Uma frase do tema original de Berry ficaria mesmo no poema de Lennon, “Here comes old flat-top”. Basta, de resto, escutar a versão de Berry0, executada anos antes de Lennon escrever o seu tema, para perceber as semelhanças. Aliás, anos mais tarde, Lennon, num acordo judicial, faria uma versão do original de Berry. Os dois chegariam mesmo a encontrar-se em 1972. Sendo um dos últimos hits para THE BEATLES, o tema teve inúmeras versões, algumas de nomes do hard rock, ou até do punk como os BUTTHOLE SURFERS. Exemplos dessas abordagens são os casos dos doomsters TROUBLE, dos grungers SOUNDGARDEN ou dos hard rockers GOTTHARD. Também os BLACK LABEL SOCIETY conseguiriam uma versão mais fraca, embora introspectiva, do tema. Já os GODMACK optaram por uma abordagem by the book. No entanto, seria em 1978, numa daquelas colectâneas típicas dos 70s e 80s, feitas para resolver problemas, que surgiria uma versão com potencial para superar o original. Na linha, os AEROSMITH. A banda que tinha em THE BEATLES e LED ZEPPELIN as principais referências e que, depois, resolveu levantar poeira e quase terminou mal.

O tema começa por surgir na colectânea «Sgt. Pepper’s Lonely Heart’s Club Band», que integra vários artistas, e quase ao mesmo tempo, também numa colectânea da banda de Boston. Na versão do final dos anos 70, Steven Tyler rouba toda a interpretação, mas não consegue ofuscar a secção rítmica que percorre o tema. Ao longo dos anos, pontualmente, a canção foi sendo recuperada para actuações do grupo e o apogeu, entre os registados, acontece em Donington, no ano de 2014, e imortalizado no DVD «Aerosmith Rocks Donington 2014». No tema está lá a prestação de Tyler, sim. Também a secção rítmica faz um excelente trabalho, mas é Joe Perry que brilha na guitarra solo, lembrando, aos mais esquecidos, como ainda hoje é um dos melhores guitarristas do género, nos Estados Unidos. Sem dúvida que esta é uma versão de tirar o fôlego, mas para registo e encerrar, referência ainda a um mash up giro, entre Lemmy e THE BEATLES, a propósito deste tema. Recorde-se ainda um encontro improvável entre egos bastante distintos na dimensão, mas diferentes representações do stardom norte-americano: Bruce Springsteen e Axl Rose, também eles unidos por «Come Together».