AQUELA VERSÃO #43: Os SOUNDGARDEN e o seu «Black Hole Sun»

Afinal já passaram quase três décadas desde que a banda de Seattle escreveu «Black Hole Sun». O tema vinha no pack de canções de «Superunknown»;disco de sucesso, mas um sucesso tardio. Afinal, os SOUNDGARDEN tinham-se tornado conhecidos a nível internacional em finais dos 90s. Durante um par de anos, foram mesmo o grupo saído de Seattle com mais exposição mediática. É claro que os QUEENRYCHE, os MENTORS e os MELVINS já existiam bem antes – no caso particular destes últimos, já andavam a gravar álbuns uma década antes do grupo liderado Chris Cornell ter dado os primeiros passos. Acontece que, aquando do fenómeno/explosão do grunge, os SOUNDGARDEN ombreavam como nomes como NIRVANA, MOTHER LOVE BONE, PEARL JAM ou SCREAMING TREES, mas os seus discos teimavam em não arrancar. Mesmo com o «Badmotorfinger», editado naquele mítico ano de 1991, acabaram eclipsados pela torrente de clássicos e nem uma digressão europeia com os GUNS N’ ROSES os ajudaria muito. Seria o álbum seguinte, «Superunknown»,que os levaria aos discos de platina, correspondentes a mais de seis milhões de cópias vendidas, ao sucesso radiofónico e às listas de “melhores”. Para a Rolling Stone, por exemplo, está entre os dez melhores discos de sempre no grunge.

Lá dentro estão singles como «Spoonman», «The Day I Tried To Live», «Fell On Black Days» ou «Black Hole Sun». O título do tema foi retirado de uma frase que Chris Cornell obtivera, a acaso, nas notícias. Daí, segundo o próprio, desenvolveu a estranha letra e só depois a música. Tornar-se-ia o tema mais facilmente associado ao grupo, aquele que mais vendas garantiu e também o mais abordado por outros artistas. Para muitos é o tema iconográfico para a depressão associada a Seattle e ao grunge. Garantiu-lhes também um Grammy, para Best Hard Rock Performance. Indirectamente garantiu ainda outro, mas a Peter Frampton. “Para mim, o mais interessante, é mesmo a combinação de buraco negro e Sol”, reflectiu Cornell, posteriormente, em entrevista à britânica Uncut. “Um buraco negro é um milhão de vezes maior que um Sol, é um buraco, um gigantesco círculo de nada, e depois tens o Sol, que dá a vida. Foi esta combinação de luz e escuridão, este sentimento de esperança e calma, que mais me atraiu”. O cantor revelava então ter gostado “da maneira como as palavras apareciam quando escritas”, referindo gostar “da fase de Syd Barrett nos Pink FLoyd, onde há sempre uma veneração feliz de algo obscuro”. Admitia não conseguir escrever letras de forma propositada, confessando que lhe ocorriam por acidente. Interessante será escutar Dave Grohl relembrar-se de quando escutou o tema pela primeira vez.

Com a passagem do tempo, mesmo depois do hiato, o grupo continuou a tocar «Black Hole Sun» de forma regular, e o tema acabaria mesmo por transformar-se num ícone sonoro do grupo, mesmo que cada vez mais melancólico, como se o buraco negro tivesse vencido a luz. Também na sua carreira a solo, Cornell não negligenciava a canção, tocando-a principalmente em formato acústico, numa abordagem em que soava cada vez mais próximo do que um Mark Lanegan poderia fazer com a malha. E também a cantou com os AUDIOSLAVE, como fez no Live 8, em Berlim, em 2005. Anos mais tarde, Peter Frampton faria então uma das versões mais originais do tema. Em «Fingerprints», de 2006, o guitarrista apresentava uma interpretação totalmente instrumental da canção, ignorando as letras e a peculiar voz de Cornell. Apenas a letra “Black hole sun, won’t you come” se pode reconhecer, através do uso de uma talk box. O disco receberia um Grammy em 2007 e Frampton ainda hoje beneficia do sucesso do original para ter um ponto alto nos seus concertos. Porém, as versões não ficariam por aqui e, também em 2005, numa daquelas abordagens ao rock que alguns crooners gostam de fazer ocasionalmente, foi a vez de Paul Anka revisitar o tema. Apesar de resultar bem, é curioso pensar na volta que um clássico do grunge deve ter dado para chegar ao ambiente de casino e das big bands em que Anka se move. Ainda no mesmo espírito, que tal pensar que uma artista como Anastacia, também faria a sua cover? O crime data de 2012.

Noutro plano, mais LOUD!ável, os THE ACACIA STRAIN resolveram fazer a versão gutural em 2016, no «Depression EP», onde o tema partilha espaço com outras duas versões curiosas: «Du Hast», dos RAMMSTEIN, e «The Perfect Drug», dos NINE INCH NAILS, executadas por outros tantos artistas. Gutural, arrastada, quase doomíca, com a guitarra a evoluir muito perto do solo original, acaba a resultar menos apelativa que a de Paul Anka, mas certamente mais interessante. Também os HAZEN fizeram a sua versão, mas de longe menos aceitável. No entanto, seria já nesta década, nos concertos ao vivo de Norah Jones, que surgiria a que provavelmente é a mais interessante versão de «Black Hole Sun». Num formato bem melancólico, ao som do piano, a cantora respira a letra, carregando-a da melodia que Anka tentou dar, e ao mesmo tempo revestindo-a da intimidade que o tema pede em certos momentos. Pode encontrar-se no álbum «…’Til We Meet Again»,de 2021. Com a morte de Cornell, o tema acabaria por ser alvo de uma série de abordagens, em actuações celebratórias do artista. Robert Trujillo, dos METALLICA, os U2, Ann Wilson com Jerry Cantrell e vários outros. Talvez a de maior destaque, porque feita por um antigo músico de Seattle, é a dos GUNS N’ ROSES, com Duff McKagan na voz. Um tema que Portugal gostaria de ter voltado a escutar e uma bonita homenagem a mais uma das vítimas da praga de Seattle. Um tema que, infelizmente, Chester Bennington não viria a ter a oportunidade de gravar, em homenagem ao seu amigo, para quem cantou – e com quem cantou.