DEF LEPPARD: “Isto é um projecto de uma vida e há que continuar a dar no duro.” [entrevista]

É já amanhã, sexta-feira, dia 27 de Maio, que chega as lojas o novo trabalho dos DEF LEPPARD, «Diamond Star Halos». O 12.º disco de estúdio da banda foi gravado ao longo dos últimos dois anos com Ronan McHugh como co-produtor, inclui quinze temas, e o título é retirado de «Bang A Gong (Get It On)» dos T-Rex. Aliás, T-Rex, David Bowie e Mott The Hoople são de certa forma homenageados ao longo deste novo álbum, que conta ainda com a participação especial de Alison Krauss em dois temas. Estivemos à conversa com o guitarrista Phil Collen para desvendar mais alguns pormenores.

Como passaste esta pandemia?
Para mim foi óptimo! Trabalhámos muito mais, porque nem nos tínhamos apercebido que tínhamos gravado um disco. [risos] Isso foi espectacular, ter feito algo exactamente da maneira que preferimos. Não sei se vamos voltar à velha fórmula e voltar ao estúdio no futuro, porque desta forma conseguimos fazer tanta coisa de forma criativa e artística, foi tão melhor do que o habitual…

Vocês que têm um membro da banda na Irlanda, outro no Reino Unido, outro nos Estados Unidos… o facto de estarem separados acaba por funcionar melhor, ao invés de terem que conjugar agendas para estarem juntos em estúdio a trocar ideias?
Na verdade, acho que fico mais frustrado quando não consigo acabar algo, quando alguém interrompe a fluidez do que estou a fazer, percebes? Eu gosto de acabar uma ideia. O que fizemos tradicionalmente neste disco, foi eu enviar uma ideia ao Joe [Elliot, vocalista], e no dia seguinte chegava-me a resposta por e-mail. Eu ficava todo entusiasmado e respondia-lhe logo com mais um desenvolvimento. Fizemos isso com cerca de cinco temas. Eu co-escrevi três canções com outra pessoa, e o Joe trouxe outras três. Houve tanta interacção entre nós os dois, e quando sentíamos que já tínhamos feito o melhor que podíamos, era nessa altura que envolvíamos o Sav [Rick Savage, baixista] e o Vivian [Campbell, guitarrista] e lhes perguntávamos se ainda podiam acrescentar algo. E eles assim o faziam. Foi óptimo. Antigamente, e durante anos, em estúdio, tínhamos de esperar que alguém acabasse uma voz ou uma parte de guitarra, por exemplo, e isso interrompia a fluidez da criatividade. Desta forma, podíamos estar com a nossa família e ir para a praia, por entre sessões de criatividade e da própria gravação. Pude brincar com o meu filho, que tem três anos, e um minuto depois começar a gravar as minhas partes. Foi muito inspirador para mim. Eu sei que não é algo tradicional, mas para nós foi óptimo. Em boa verdade, sempre gravámos de forma separada, só que desta vez estávamos em continentes diferentes em vez de salas diferentes. [risos]

Com a digressão de estádios e arenas que tinham planeada, o álbum não seria algo que estivesse nos vossos planos para já. Quando é que se aperceberam que não podiam ir a lado nenhum, e que o melhor era começarem a compor?
A minha filha fez doze anos no dia 19 de Março de 2020, fui ao aniversário dela e era suposto voar para Dublin no dia seguinte… e disseram-me que não havia voos internacionais. Foi por essa altura, portanto. A ideia era tentar perceber quantas canções tínhamos, porque nessa altura ainda pensávamos que íamos em digressão na mesma passados uns meses. No entanto, rapidamente se tornou óbvio que ninguém ia a lado nenhum tão cedo e que a digressão ia ser adiada de forma indefinida. Foi ai que decidimos começar a escrever, e até era música que nem era destinada especificamente a um disco dos Def Leppard. Assim sendo, não havia nenhuma pressão, porque estávamos a escrever canções apenas pelo prazer de as escrever. Penso que o que acabou por acontecer enquanto gravámos, foi que demos por nós a celebrar um período de tempo, a altura em que entrámos na música. Para mim, foi quando tinha catorze anos quando vi o meu primeiro concerto. Foram os Deep Purple e o Richie Blackmore foi o responsável por eu ter começado a tocar guitarra. Depois vi o David Bowie no Top Of The Pops e isso mudou a minha vida completamente. Foi um período muito especial para nós enquanto miúdos porque estávamos à procura da nossa identidade. E enquanto estávamos a escrever estas novas canções, estávamos a celebrar isso. Quando decidimos chamar ao disco «Diamond Star Halos» – que é uma letra dos T-Rex – foi porque havia muita ligação entre as canções. Até mesmo a capa e o artista que a fez, tivemos essa conversa com ele… e as coisas começaram a encaixar umas nas outras e a ganhar uma vida própria. Depois tivemos o fotógrafo Anton Corbijn a tirar as fotos e ele acabou por se envolver também naquilo que estávamos a fazer. Foi tudo muito excitante, principalmente porque não era essa a nossa ideia inicialmente. Acabou por acontecer de forma natural.

Com uma carreira já tão longa e recheada de sucessos, continua a ser importante para vocês continuar a criar música nova? Ainda faz sentido ser criativo nesse aspecto?
É muito importante! É tudo! Acho que não conseguiria ser de outra forma. É como um pintor, não lhe podes dizer para parar de pintar só porque tem uma série de pinturas clássicas. É impossível, ele continua a querer pintar. E continua a melhorar quando o faz. Eu estive a escrever canções com outros compositores, e foi o Brian Monaco da Sony Music que me disse que devia escrever com aquelas pessoas. Ele próprio tratou dessa ligação, e foi óptimo. Muito inspirador. Adorei. Três canções neste disco foram escritas com outras pessoas com quem nunca tinha trabalhado desta forma. A «This Guitar» foi escrita com o meu amigo C.J. Vanston, e a «Kick» e «Fire It Up» foram escritas com o Dave Bassett e o Sam Hollander. Mais uma vez, não eram músicas para os Def Leppard, a ideia não era escrever temas de “rock de estádio”. Mas quando as mostrei ao Joe, ele disse logo que eram músicas dos Def Leppard, que eu era maluco por pensar o contrário, e que tínhamos de as usar para a banda. Honestamente, penso que a composição é o mais importante. Tocar ao vivo é importante, envolve muita preparação e coisas do género, e é por isso que temos uma banda em primeiro lugar, que é para tocar ao vivo. E mesmo assim, acho que ainda não atingimos o nosso objectivo nesse aspecto. Queremos ser como os Rolling Stones quando vão em digressão, ou como os Queen. Os Queen têm um catálogo musical que, onde quer que estejamos, seja no Brasil ou noutro lugar qualquer no mundo, se alguém ouve um tema dos Queen, isso tem um significado especial. É isso que nós aspiramos a ser. Ainda não chegámos a esse ponto. Ainda estamos a fazer essa caminhada, e não é qualquer banda que consegue atingir esse objectivo porque ou acabam ou desistem quando chegam aos 40 ou 50 anos. Mas nós continuamos a insistir.

Seria demasiado fácil serem um pouco preguiçosos e continuarem a tocar o «Hysteria» de principio ao fim todas as noites? [risos]
Absolutamente! [risos] Há bandas que fazem isso e começa a ser um cansaço. Para nós é inspirador continuar a fazer isto. Estar em boa forma física, continuar a cantar bem… é um projecto de uma vida e há que continuar a dar no duro.

Quando estava a ouvir o disco, houve três temas para mim que se distinguiram: «Kick», «Fire It Up» e «Gimme A Kiss». Acho que se vão encaixar perfeitamente num alinhamento dos Def Leppard. Quando escrevem os temas, pensam nesse factor, se a coisa se encaixa na vertente ao vivo?
Com a «Kick» isso não aconteceu, porque escrevemos a canção a pensar que seria para uma artista feminina, uma espécie de Joan Jett dos tempos modernos. Mas de resto, absolutamente. Quando enviei a demo de «Gimme A Kiss» ao Joe ele respondeu logo a dizer que sabia perfeitamente como o tema se iria desenvolver. Eu tinha o refrão, os acordes e tudo o resto. No dia seguinte, quando acordei, já tinha a letra e ele percebeu exactamente o que era preciso fazer. É excitante e é rock. É exactamente aquilo que nós queremos ouvir. Nós queremos ouvir outras bandas fazer isto, mas ninguém escreve este tipo de música. Por isso, nós temos de escrever as canções para sermos fãs delas, se é que faz sentido o que estou a dizer? [risos] Essas três canções são o que eu quero ouvir. Quero ouvir isso de outra banda, mas ninguém parece fazê-lo.

Outra coisa que destaco neste disco é o som da guitarra, bem mais pesado que o normal. Foi intencional?
Talvez porque não gravámos da forma tradicional, em estúdio. Se o tivéssemos feito, se calhar o som seria mais clínico, tecnicamente melhor. Mas muito das guitarras – e vozes! – que se ouvem no álbum são versões demo. Por exemplo, na «Kick» há um barulho na guitarra de que não nos conseguimos livrar. Ouve-se bem… Normalmente, teríamos gravado novamente, mas como soava fixe, resolvemos deixar. O Ronan McHugh – que é co-produtor e engenheiro de som – disse que soava excitante. Penso que mantivemos a adrenalina, e o mesmo aconteceu com os backing vocals. Ao invés de gravamos umas 90 pistas de voz, na «Kick» gravei oito pistas, o que é bastante menos que o normal, mas tem muita personalidade. Mas tens razão, principalmente o som de guitarra e das vozes está mais agressivo… Gravei directamente para o meu computador. Usei um software, não usei amplificadores. É o mesmo som que tenho usado nos últimos anos, pesado, e que funcionou perfeitamente com estas canções.

A Alison Krauss participa em dois temas. Como surgiu a ideia de colaborarem com ela?
Já a conhecemos há muitos anos. Ela é grande fã da banda e nós somos grandes fãs dela. Ela tem uma voz incrível. O Joe e o Robert [Plant] falam muitas vezes sobre futebol. O Joe é do Sheffield United e o Robert é fã dos Wolves. Houve uma altura em que os Wolves tinham acabado de vencer o Sheffield e por isso os dois estavam em amena cavaqueira com o Robert a gozar com o Joe. Nessa conversa o Joe disse que estava a gravar um disco, e o Robert disse que estava a gravar com a Alisson Krauss, e que ela iria ficar contente por saber que os Def Leppard estavam a gravar música nova. Ela acabou por saber disso, e o manager dela perguntou-nos se ela podia cantar num dos temas. Nós enviamos duas canções com a ideia de ela cantar um pouco num deles, mas ela respondeu a perguntar se podia cantar nos dois! Nós dissemos: “claro!!” Ela gravou uma série de vozes e de backing vocals e nós acabámos por manter tudo! Gostamos muito da voz dela, e é uma excelente pessoa.

Há ainda a participação do Mike Garson, teclista do David Bowie. Porque estarem a evocar todas as vossas influências, pensaram em quem daquela altura podia ser convidado para encaixar neste disco?
Não surgiu dessa maneira, mas faz todo o sentido. O Joe estava a fazer umas coisas de tributo ao David Bowie, e duas das músicas que ele escreveu foram ao piano. O Joe é o primeiro a admitir que não é o melhor executante no piano, mas consegue escrever. Ele falou com o Mike e disse-lhe que havia dois temas com piano, e se ele não se importava de as tocar. O Mike disse logo que sim! Assim que ele participou, então tornou-se óbvio que havia uma relação com o que mencionaste, e até o solo de guitarra evoca o tema «Lady Grinning Soul» do álbum «Aladdin Sane», que o Mick Ronson faz numa guitarra acústica. Acabou por influenciar tudo o que estávamos a fazer, em boa verdade.

Há alguma banda nova que tenha capturado a tua atenção recentemente?
Há… mas é uma canção aqui e ali. Por exemplo, gostei do disco de Silk Sonic que junta o Bruno Mars e o Anderson Paak. Achei que havia boas canções com autenticidade. Mas bandas novas, nem por isso. Ainda estou à espera de ouvir uma banda nova que me entusiasme. A última grande banda que ouvi terão sido os Foo Fighters e isso aconteceu há 25 anos! [risos]

E os Ghost?
Adoro os Ghost. Sim, não me tinha lembrado deles, gosto muito dos Ghost!

O novo álbum deles é muito bom. Li numa entrevista que eles se inspiraram um pouco nos Def Leppard para comporem os temas… isso conta como elogio, na tua opinião?
Acho que é um grande elogio. Adoro-os desde que vi o vídeo para o tema «Secular Haze». Gosto muito de híbridos… porque a música parece saída dos anos 60, mas é hard rock e tem uma imagem própria. Isso é óptimo.

«Diamond Star Halos» está disponível no próximo dia 27 de Maio através da Universal Music Entreprises.