FAITH NO MORE: «Angel Dust», o melhor álbum que alguma vez gravaram?

Olhando para trás, não é fácil perceber que o imenso sucesso atingido em 1990 deve ter sido desconcertante para os FAITH NO MORE que, até o híbrido de rock/metal de «Epic» ter explodido na MTV, eram essencialmente uma banda underground habituada a tocar em clubes. De um momento para o outro, os membros da banda viram-se atirados para as capas das maiores revistas da especialidade e começaram a fazer digressões por todo o mundo, ao lado de nomes tão diversos como BILLY IDOL e os METALLICA. Foi, portanto, na sequência de uma muito intensa campanha de promoção a «The Real Thing» que a banda de São Francisco sentiu necessidade de tentar afastar-se dos estereótipos que, naquela altura, caracterizavam os monstros mainstream em que eles próprios sentiam estar a transformar-se. “Depois de andarmos na estrada durante ano e meio com o «The Real Thing», que provavelmente foi o álbum mais convencional que já fizemos, ser convencional deixou de ser emocionante”, disse o baixista Billy Gould numa entrevista com o jornalista Jon Wiederhorn aquando do 25.º aniversário do álbum. “Tínhamos uma necessidade real de redescobrir a música novamente, e fizemos isso com o «Angel Dust». Sei que houve muito desânimo por parte de algumas pessoas por termos adoptado essa abordagem, mas acho que, como artistas, era a única abordagem que poderíamos ter.

Depois de terem composto a maioria dos temas ao longo de 1991, os FAITH NO MORE entraram em estúdio já em Janeiro de 1992 com Matt Wallace, o mesmo produtor com que tinham trabalhado em «The Real Thing». Os temas foram captados em dois estúdios em São Francisco, os Coast Recorders e os Brilliant Studios — e, reza a lenda, com a excepção do guitarrista Jim Martin, que não gostou assim tanto do processo, os músicos passaram um bom bocado a dar uso aos seus músculos criativos e a explorar áreas que, até então, nunca tinham sequer pensado pisar. Fruto da atitude aventureira que pautou os processos de composição e gravação, quando foi lançado, no dia 8 de Junho de 1992, o «Angel Dust» afirmou-se desde logo como um disco excêntrico, exigente e musicalmente enviesado. É certo que há aqui temas, como o single «Midlife Crisis», com a sua batida sincopada, sintetizadores lustrosos e o refrão pop, que podia bem estar no «The Real Thing». No entanto, também não há como negar que, no geral, é um bolo de digestão bastante mais complicada que o seu antecessor.

Ao longo do alinhamento, os FAITH NO MORE desafiam as convenções e, sobretudo, brincam com a fórmula que os tornou famosos. Ouça-se a forma como alternam um riff de guitarra distorcido com uma passagem sussurrada e um groove estranho de baixo na «Caffeine»; a melodia carnavalesca e a vocalização áspera de «RV», a melodia de piano que, em «Everything’s Ruined», desemboca num ritmo funk pulsante; ou a descarga thrash de «Malpractice», que não soaria deslocada numa maqueta dos MR. BUNGLE. Pois bem, se a música é de nos deixar de queixo caído, as letras também não se lhe ficam atrás, com Mike Patton a revelar toda a sua veia provocatória ao abordar assuntos tão pouco mainstream como sexo oral (em «Be Aggressive»), estrelas porno («Jizzlobber») e, no caso de «Crack Hitler», vá-se lá saber o quê. Uma coisa é certa, no entanto: ao longo de 13 temas, os músicos disparam em todas as direcções e, vá-se lá saber como, conseguiram criar um longa-duração incrivelmente coeso, que espelha na perfeição um grupo de músicos no apogeu da sua criatividade.