KYUSS: «Welcome To Sky Valley», golpe de génio ou de misericórdia?

A 28 de Junho de 1994, uma banda pouco conhecida chamada KYUSS ofereceu aos fãs de rock e metal uma aventura quente com o lançamento de «Welcome To Sky Valley», o seu terceiro álbum de estúdio. Nos anos seguintes, o disco acabaria por transformar-se na pedra angular do movimento desert rock. Na altura, há quase uma década que o grupo formado pelo guitarrista Josh Homme, o vocalista John Garcia, o baterista Brant Bjork e o baixista Nick Oliveri vivia o estilo de vida que sua música apregoava: cerveja, charros e rock pesadão. No início eram uma banda de garagem como tantas outras, feita de adolescentes que tentavam afastar o tédio no deserto pouco povoado Califórnia. Respondendo inicialmente pela designação SONS OF KYUSS, que pediu emprestado a um personagem do ‘Dungeons & Dragons’, o jovem quarteto reuniu duas das suas influências musicais formativas (o hardcore e o metal) no seu álbum de estreia, «Wretch», de 1991. Posteriormente, com a preciosa ajuda do produtor Chris Goss (dos MASTER OF REALITY), os KYUSS trataram de refinar e expandiu o seu som, juntando ao caldeirão pitadas de psicadelismo, rock indie e, de forma ainda mais proeminente, ingredientes de space rock. O som tornou-se ainda mais pesado, com o «Blues For The Red Sun», de 1992, a deixar muito boa gente de queixo caído.

Estava, ali, aperfeiçoada, a fórmula do stoner/desert rock, traduzida num som verdadeiramente aventureiro. Ao alimentar sua guitarra através de uma coluna de baixo, Homme não só produziu um som mais crunchy, como acentuou os seus riffs e grooves, numa época em que o metal estava a sair da era dos solos intermináveis. Estimulados pela percussão de Brant Björk, pesada em pratos, os KYUSS emergiram como os melhores exploradores da mente do rock mais pesado, provavelmente, desde os HAWKWIND. Preparado o terreno, esperava-se que o próximo passo fosse um enorme avanço comercial para a banda, mas tal não aconteceu. As coisas começaram logo tortas: infelizmente, apesar de ter sido rapidamente gravado no início de 1993 com o novo baixista Scott Reeder, o «Welcome To Sky Valley» acabou por estar a definhar num limbo editorial até ao Verão de 1994. Ainda assim, quando foi editado em Junho, recolheu rapidamente tantos elogios da crítica quanto o seu formidável predecessor e manteve os ouvintes atentos ao agregar em dez canções — sem incluir a faixa oculta de menos de um minuto , «Lick Doo» — toda a gama KYUSS, que incluía tudo, do metal ao psicadelismo.

Apesar do «Blues For The Red Sun» ter marcado uma progressão radical em relação ao «Wretch», o «Welcome to Sky Valley» baseia-se no seu antecessor, mas envia a banda ainda mais longe na sua viagem exploratória. A edição original, em CD, surgia sequenciada em três grupos de suítes, tudo para evitar que o ouvinte saltasse temas e perdesse a atmosfera geral do disco. A verdade é que, mesmo com as canções divididas, é difícil pressionar o botão de avanço rápido ao longo do álbum. Mesmo assim, é fácil destacar um tema, o de abertura, «Gardenia», construído em cima de um groove genial, em três minutos e meio de desert rock perfeito. Entre divagações cósmicas, a nova arma da banda, o baixista Scott Reeder, torna sua presença notada, com as suas quatro cordas a borbulharem e a extraírem grooves a partir dos riffs de Homme em vez de os dobrarem — ouçam-se, por exemplo, os preenchimentos na colossal «Asteroid». É certo que não há aqui hits óbvios, mas não deixa de ser surpreendente como todos os temas fluem de forma fácil, num alinhamento pensado com pés e cabeça. Infelizmente, nenhuma das canções obteve suficiente adoração para que o «Welcome To Sky Valley» chegasse à Billboard 200 e, desiludido com o clima dentro do grupo, Bjork acabaria por sair pouco tempo depois, sendo substituído por Alfredo Hernandez.

Embora a banda ainda tivesse mais um álbum dentro de si, o menos equilibrado «When The Circus Leaves Town», de 1995, o «Welcome to Sky Valley» representa o culminar da história dos KYUSS, o auge do espírito nómada da banda. Lançado num momento em que a música tendia para uma toada mais introspectiva e sombria, a banda era uma luz ao fundo do túnel, com a sua atitude sempre optimista e carregada de boas vibrações, mesmo quando se aproximava ruidosamente do vazio. Há, felizmente, algo de positivo a retirar deste “início do fim” de uma banda que se tornou lendária. As vendas aquém das expectativas e a exposição modesta — há por aí quem tenha histórias lendárias de concertos em clubes para escassas dezenas de pessoas no auge da sua popularidade –, foram totalmente eclipsadas pela sua enorme influência que os músicos tiveram em toda uma geração de músicos apostados em replicar o seu génio. Na verdade, feitas as contas, duas décadas depois dos músicos terem decidido seguir caminhos diferentes, álbuns como este «Welcome To Sky Valley» continuam a pairar de uma forma cada vez mais evidente sobre a paisagem rock moderna.