NEGRO MAIS PROFUNDO #04

Fora dos habituais círculos do black metal nacional, inscrevendo-se num blackened death metal, os três elementos dos WINTERMOONSHADE estão em fase de partir pedra, procurando tocar, e organizar mesmo uma digressão nacional. Nos dias que correm, é de longe mais fácil conseguir uma edição no estrangeiro que percorrer Portugal. O seu primeiro registo, o homónimo «WinterMoonShade» teve edição pela britânica Black Spark Records. O segundo consegue selo da espanhola Art Gates Records, beneficiando de ainda mais exposição. “Neste novo trabalho, tivemos ainda mais atenção na criação dos temas, em termos de estrutura, assim como das passagens de riffs e ambiências para que, ao serem escutados, o ouvinte possa ter uma percepção mais linear do que acontece musicalmente”, reflecte Haze, o vocalista e guitarrista do projecto. “Houve também uma especial atenção na parte lírica para que as músicas tivessem conteúdo mais sombrio e também para dar relevo ao título do álbum. E ainda a nível visual, o planeamento da capa e todo o material gráfico teve um maior foco de forma a complementar e se alinhar com todo o conceito deste segundo disco”. E sim, sente-se de facto a evolução, da mesma forma que desde o primeiro trabalho se percebia o cuidado visual. No entanto, se no primeiro disco, o título era compreensível, já neste há que esclarecer a causa. “Embora maioritariamente através de metáforas no contexto lírico, o título deste segundo capítulo é inicialmente inspirado por vivências nossas aqui na costa oeste, mais propriamente Santa Cruz. O Penedo do Guincho, um forte marco da zona, está representado na capa do disco para evidenciar as nossas origens. Na criação, o disco foi sendo envolvido neste tipo de atmosfera mais escurecida e fantasmagórica de modo a solidificar a temática pretendida”. Há toda uma simbologia a descodificar nas obras deste grupo, deve dizer-se. Reinterpreta-se um imaginário popular e centra-se a atenção no local, em lugar das habituais divagações sobre satanás, sexo e metal, que se encontram um pouco por todas as comuns letras de black.

Com o álbum homónimo a ser lançado em 2020, através de um selo britânico, o grupo atravessou “um período de amadurecimento e de experiências em termos musicais na sala de ensaio”, afirmou Haze à LOUD!. Aquele que é vocalista e guitarrista do trio, declarou também que, após a saída da primeira editora, se iniciou então uma busca por um novo selo, contribuindo isso “para um novo objectivo e mais afinco na tentativa de criar algo mais consistente em termos de identidade, tanto ao nível musical como visual. Segundo o músico, acham “que a Art Gates Records tem feito um excelente trabalho de divulgação para mostrar o álbum. Sentimos que foi mais um passo bem conseguido para chegar a mais gente e ganhar mais algum interesse também por parte da comunicação que escreve e apoia o metal”. A editora está mais presente que antes, pelo menos na divulgação do disco. “Por parte da Art Gates Records foi nos solicitado a criação de três vídeos para ilustrar e ampliar a propagação da saída dos singles de apresentação”, revela Haze, como que demonstrando a maior ligação que o grupo agora possui com o selo que o edita. “O tema «Eternal Haunted Shores» deixamos por último como um culminar desta trilogia por ser o título do álbum. Em primeiro lugar apostámos num vídeo para «Wolf Whispering Dream», em que quisemos dar uma atmosfera de ritual de chamamento, como se fosse dentro de um sonho em que o espírito do lobo, chega até nós numa visão mágica através da floresta. No segundo vídeo criado para «Lusitânia Night Noises» quisemos incluir, para além da banda a tocar o tema no nosso antigo local de ensaio, umas passagens na praia de Santa Cruz onde uma vez mais é visível o Penedo do Guincho como background”.

O trio completa-se com o baixista Fenrir, e o baterista Zefir. Todos possuem uma apresentação própria, por trás de máscaras especialmente concebidas para o grupo. “Inicialmente, quando surgiu a ideia de máscaras de folhas, recolhemos materiais da natureza para iniciar o processo de construção das mesmas. O aspecto ficou em nosso ver, bastante original e bem sucedido”, conta o nosso interlocutor. Acontece que “a nível de conforto as primeiras tentativas eram muito toscas, o que nos impedia praticamente de ver ou sequer respirar o que tornava o tocar muito difícil e claustrofóbico. Resolvemos pedir ajuda a uma amiga nossa, a Inês Santos, experiente em artes plásticas para nos criar novas versões que fossem mais adequadas para o efeito”. O objectivo das máscaras passa por “transmitir uma ligação à Natureza, à parte espiritual e ao ocultismo e as nossas máscaras representam uma abstenção da parte estética pessoal de cada um de nós, para dar espaço à união das nossas funções colectivas para a banda”. Quando ao mais recente registo, desenvolve-se ao longo de nove temas, terminando com «Winter Moon Shade». “Este foi o único tema sem título prévio no momento da construção e acabou por ser sugerido o nome “Winter Moon Shades” por toda essa mesma atmosfera mágica que nos levou à nomeação da própria banda como WinterMoonShade. Ficou óbvio para nós também que esta seria a faixa de encerramento do nosso segundo capítulo discográfico”.

Neste segundo trabalho, servem um disco mal passado, num contexto em que devia ser bem cozinhado. Faça-se a reflexão sobre «Cold Howling Wind», faixa grandiosa, de veia sinfónica, que bebe muito nos EMPEROR, por exemplo. Bem construída, numa odisseia sonora grandiosa. Na outra face da moeda, a produção não consegue trazer o melhor dos músicos, em particular a bateria com o bombo a precisar de mais definição. Notando-se a falta de uma produção mais cuidada. «Eternal Haunted Shores» é uma das faixas mais fortes do disco, tal como é complexa e ambiciosa. Talvez por isso, «Origins and Solitude» perde um pouco o brilho, por vir na sequência. Um claro caso em que redistribuição de faixas, ou inclusão de intros, melhorariam o disco, sem alterarem a composição de faixas. Mesmo assim, um passo válido num grupo que tarda a surgir em palco, para assim limar arestas nos seus temas.