Verão. Calor. Todo aquele ambiente pré-festival de Verão em que se escolhe o destino dividindo o preço do bilhete pelo número de bandas. Cosem-se battlejackets que nunca antes estiveram num circle pit e corre-se à loja para comprar uma t-shirt à maneira. Confia-se no parecer daquele amigo mais nerd para saber que interessa “ver aquela banda”, além da obrigatoriedade de estar presente na altura do cabeça-de-cartaz cujo nome se ignora. Depois é partilhar os vídeos, amaldiçoar a tenda, tentar não dormir, ou não deixar dormir, sair de lá com mais dois ou três nomes de referência para descarregar uns ficheiros. Muitas fotos manhosas, uns vídeos no telemóvel que nunca se chegam a ver e longas discussões nas redes sociais em que se tenta defender o nome de um festival não porque tem um bom cartaz, mas porque lá se esteve.
O RETROVISOR também aprecia festivais e tal, mas fica aqui uma sugestão mais refinada, alguns chamariam mesmo “gourmet”: ir até um clube, assistir a um daqueles nomes que tanto podem terminar amanhã, o mais provável, como ser uma lenda passado vinte anos. As contas fazem-se fácil, ainda sobra dinheiro para cerveja e o mais próximo do campismo é esperar pelo próximo comboio ou autocarro que chega na manhã seguinte. A compensação vem no prazer de sentir o rock na cara, estar tão dentro do palco que até um ecrã de telemóvel parece excessivo. Não que nos anos 80 existissem telemóveis, mas também teriam durado pouco num concerto dos BLACK FLAG.
Designação correcta, à época, hardcore, pois punk associava-se a um movimento trendy, por isso renegado pelos nomes mais novos. Mas aquilo que os BLACK FLAG ou os DEAD KENNEDYS faziam era punk seminal, a anos-luz do que se tornariam uns OFFSPRING ou GREEN DAY ou mesmo daquilo que algumas encarnações recicladas viriam a ser; basta ver a última polémica dos DEAD KENNEDYS face a um cartaz a propósito de uma recente tour brasileira que acabou por não acontecer. Não há muito para perceber; corpos, alguma música e atitude. Muita atitude.
Aqui interessa a atitude e energia, lendária, de um grupo que marcou uma geração e com um vocalista que se tornaria uma referência por si próprio: Henry Rollins, rockstar, artista de cinema e TV, ícone da spoken word e um fabuloso contador de histórias. Há uma memória, aqui no RETROVISOR, da quarta edição de Paredes de Coura, em que a presença de Rollins e sua banda, levou a toda uma afluência de personalidades da música, ajudando a colocar o festival no mapa. Curiosamente, após todo o entusiasmo, acabaram a ser os MÃO MORTA a limpar o recinto, mostrando mais uma vez que a produção nacional pode ser muito boa. E lá se volta ao início da conversa, à proposta para se visitar um clube, pagar um bilhete barato e apoiar as bandas locais. Não é preciso saber o nome do grupo, mas sempre se apoia a produção local e quem sabe, poderá ter-se uma boa história para contar, sem ser apenas mais uma do rebanho lá do festival. RISE ABOVE!