Este RETROVISOR é fácil e óbvio. NIRVANA, acústico em Nova Iorque para MTV. Um texto preguiçoso para um programa também ele curto de ideias. Alguém nos escritórios do canal de música deve ter pensado no óbvio, assegurar a presença da banda do momento, garantir uns quantos hits em meia hora de TV e garantir o boost correcto para um «In Utero» que não corria tão bem como o mítico «Nevermind». Mas do outro lado estava Kurt Cobain, alguém que desafiava o óbvio e ignorava as regras da indústria. O resultado foi quase uma hora de temas menos óbvios, versões e todo um discurso, por vezes incoerente, que só revelava como o músico não pertencia aquela realidade, ou mesmo a qualquer outra.
Inicialmente a prestação terá sido decepcionante para os fãs mais imediatistas, mas artisticamente foi conseguida e o posterior disco revelou-se um clássico. Por outro lado, sendo uma das últimas gravações antes da morte do cantor, rapidamente se tornou um documento em que cada um tenta ver o drama que se aproxima. São inúmeros os pormenores neste documento, desde a atitude, a escolha dos temas, a comunicação com os restantes elementos do grupo e convidados, até mesmo a decoração. É o retrato de um artista desencantado, ao mesmo tempo alheado da realidade, alguém a quem a indústria e o sucesso retiraram um sonho e um gosto: a música e o prazer de a tocar.
A completa negação do rockstar, e talvez por isso muitos dos fãs de heavy metal dizem que o grunge matou o género e a forma como se fazia nos anos 70 e 80. Terão razão e porventura, de certa forma, Seattle terá tido efeitos mais devastadores que o punk. Apesar dessa leitura óbvia, mais que a destruição de um presente que era excessivo, o grunge anunciou um No Future desencantado, e revelou-se um estilo “implosivo”, não sendo à toa que quase todos os frontman dos grandes nomes associados ao género viriam a morrer de overdose ou suicídio.
«The Man Who Sold The World» é originalmente um original de Bowie, mas tornar-se-ia o single e tema mais representativo da sessão, a qual se converteria numa banda-sonora fúnebre, pois no ano seguinte Kurt morreria. A massiva exposição deste concerto, de longe mais acessível a certos canais que o material de estúdio, e naturalmente mais adequado ao luto de 1994, acabaria por ser a porta para muitos dos apreciadores do grupo, tornando esta actuação ainda mais icónica. Mas a verdadeira mensagem está em «All Apologies»; autobiográfica, “I wish I was like you/Easily amused” premonitora, “Married, buried” e resignada “All in all is all we are”. De todas as estrelas, Kurt foi de longe a mais cadente.