LIVE AID e Dia Mundial do Rock; OK, a referência poderá ser óbvia, mas há aqui todo um passado que hoje dificilmente ocorreria e sobre o qual se deveria reflectir. Vamos à história, algumas reportagens de TV tinham trazido à primeira página dos jornais a fome na Etiópia. Bob Geldof, vocalista dos Boomtown Rats, resolve agir e, entre várias acções, surge a ideia de um concerto global, com um palco no Wembley Stadium em Londres, Inglaterra, onde estiveram setenta e duas mil pessoas, e outro no estádio John F. Kennedy em Filadélfia, Estados Unidos, onde cem mil estavam presentes. Ao mesmo tempo, diversas estações de TV propunham-se a transmitir em directo o evento, que duraria cerca de vinte e quatro horas, alternando as emissões entre os dois estádios, embora existissem actuações em simultâneo. Por cá, a RTP era a única estação, pelo que resolveu aderir ao directo, mas transmitir algumas actuações em diferido. Alguns grupos reuniram-se de propósito, caso dos Led Zeppelin, numa actuação desastrosa, outros aproveitaram o momento para se promoverem globalmente, caso de Sade, e outros ainda, fizeram parcerias, como Bowie e Jagger. Ao contrário de outros momentos posteriores, o hard rock não foi marginalizado, estando lá os Judas Priest e Black Sabbath.
E os Queen. Quem conhece o seu percurso na década de 70 sabe bem que as raízes do grupo estão no hard rock, continuando Brian May ligado ao estilo até hoje. Na altura o grupo tinha lançado «The Works», provavelmente o último grande disco da banda e simplesmente subiram ao palco de Wembley para 21 minutos que viriam a ficar na história da música. «Bohemian Rhapsody», «Radio Ga Ga», com os setenta mil a imitarem o vídeo, «Hammer To Fall», «Crazy Little Thing Called Love» e «We Will Rock You»/«We Are the Champions» compuseram o alinhamento para a ocasião. Em «Hammer to Fall» percebe-se o poder do vocalista e a força do riff de guitarra que carrega todo o tema. Para amantes do som pesado, terá sido o momento mais alto desta actuação, se não mesmo de todo o dia. O resultado seria que diversos álbuns do grupo regressariam aos tops mundiais, a fama aumentava exponencialmente, ao ponto de poucos meses depois o grupo tentar reviver o momento, com um concerto no mesmo local, em nome próprio e novamente transmitido por diversos canais, inclusive para Portugal.
Agora fica a reflexão necessária: dificilmente, nos dias de hoje, aquela actuação, onde a música falou por si, poderia repetir-se sem ter de vir à baila uma qualquer discussão fútil sobre sexualidade, um conjunto de tweets pró e a favor do grupo, uma primeira vaga de posts facebookianos a aplaudir o momento, seguido de uma posterior vaga de haters que apenas iriam odiar porque antes foi amado. E claro, dificilmente o público de Wembley iria aplaudir «Radio Ga Ga» como no vídeo, pois metade estaria ocupada a filmar ou a fazer selfies. Como um dia escreveu Joe Perry, «Let The Music Do The Talking», ou nas palavras de Freddie Mercury, «Is This The World We Created?».