SWR — BARROSELAS METALFEST | Dia 3 | 30.04.2023 [reportagem]

Antes de começar, parece uma lista interminável de bandas que não sabemos bem como vamos lidar. Às vezes, durante, quando as pernas ameaçam dar de si à uma da manhã, ou quando o corpo já recusa levantar-se nas “manhãs seguintes”, pensamos que já não aguentamos mais. Mas depois, o SWR acaba, e ficamos com uma sensação de vazio e com uma vontade ardente de voltar a Barroselas o mais rapidamente possível para mais uma dose. E foi assim, novamente, que o Dia 3 do festival deste ano nos deixou a sentir, até porque encerrou com algumas chaves de ouro inesquecíveis.

Destaque: TRIUMPH OF DEATH

foto: Estefânia Silva

Foi para isto que viemos, não foi? Certo, nós vamos pelo festival em si, pelo ambiente, pela malta, porque isto é o nosso “natal”, por isso tudo. Mas quase todos os anos Barroselas tem “aquela” banda, a que, se dependesse só do cartaz, era o dealbreaker, era a que nos fazia sair de casa e fazer seja lá quantos km forem para os irmos ver ao negro coração do Minho. E desta vez, tendo o lendário Thomas Gabriel Fischer, aka Tom G. Warrior, a visitar o SWR pela segunda vez – depois dos Triptykon em 2010, daí o boneco do senhor já existir naquela famosa colecção de caricaturas -, com os seus recém-criados Triumph Of Death, a tocar os clássicos dos super-influentes Hellhammer que esperámos literalmente décadas para ouvir ao vivo, não havia grande discussão sobre qual seria o prato principal desta edição. Só que, como com grande poder vem grande responsabilidade, também havia por onde isto dar para o torto. Estes regressos ao passado não funcionam sempre, ainda por cima em contextos tão particulares como este – a rudeza minimalista dos Hellhammer teve a sua época própria, globalmente e na própria vida e trajecto de Fischer, e nada garantia que o mesmo espírito ia lá estar tanto tempo depois. Mesmo em termos puramente sonoros, é difícil hoje em dia emular aquela salganhada que são muitos dos temas do icónico projecto pré-Celtic Frost (que durou menos de dois anos, para perspectivar um bocado a coisa), cheia de paixão e de veemência, sim, mas com uma ingenuidade decorrente dos poucos meios que a banda tinha na altura e da própria falta de experiência que Tom G. Warrior, Steve Warrior, Martin Eric Ain e demais integrantes que passaram pela formação tinham no manuseio dos seus instrumentos. Pois bem, quaisquer dúvidas que houvesse, foram dissipadas, diríamos, ao fim de cinco segundos de concerto. Depois de um período de expectativa com o palco já montado com a iconografia que tão bem conhecemos, a banda composta pelo já referido senhor lendário e rodeado por André Mathieu, Jamie Lee Cussigh e Tim Wey (todos eles com uma postura forte, de competência, mas também discrição e respeito pelo material) entrou em palco e avançou pelas músicas afora. Sem grandes conversas, com um apontamento histórico ou outro, recordando a origem de alguns temas – e aconselhando, bem-humorado, “patience, grasshopper” a um fã demasiado excitado por ouvir uma canção em particular -, e mantendo todas as suas nuances originais (os que eram cantados por Steve Warrior, como «Blood Insanity» por exemplo, ficam também a cargo de Mathieu), Tom G. Warrior tem a aproximação perfeita a um concerto com estas características. O som, o melhor de todo o festival, replicou a crueza necessária para que estes malhões funcionem, sem descurar a potência, e assim sendo, foi só uma questão de ir disparando clássico atrás de clássico. É a parte mais fácil, porque clássicos são todos – aliás, o setlist foi, novamente, exactamente o mesmo de todos os concertos anteriores dos Triumph Of Death. O que está feito, feito está. E o que está feito, diga-se, tem a “cara” do SWR. Em poucos outros sítios a resposta à mítica pergunta “are you morbid?” será um sim tão unânime. Os Hellhammer são das farripas de DNA mais universais a toda a história deste festival e do seu público, e o significado de estar a ouvir esta música estava bem patente no ambiente reverencial que se estabeleceu. A reacção mais efusiva terá sido talvez a «Messiah», mas em todas elas houve headbanging furioso e muitos olhares esbugalhados em direcção ao palco, todos nós um bocado incrédulos que este momento estava mesmo a acontecer. Na bela galeria das coisas incríveis que já se passaram em Barroselas e que recordaremos para sempre, este concerto vai tomar lugar de destaque. [J.C.S.]


Destaque (menção honrosa): INSANITY ALERT

foto: Estefânia Silva

Eram umas 20:00 no último dia no SWR e, até aí, os concertos dos Crisix e Mortiferum reinavam entre os que tinham decorrido no palco ABYSS. Então chegaram os INSANITY ALERT para arrecadar o título de maior jarda do festival. Assim que a banda começou a tocar, não foi necessário olhar duas vezes para o palco, para se perceber estarmos diante de uma proposta que pode não se levar muito a sério no que respeita aos estereótipos da subcultura em torno da música pesada, mas que não faz quaisquer compromissos na sua capacidade de execução musical. Para não variar, as letras versam sobre zombies, consumo excessivo de narcóticos e álcool, e referências nostálgicas à cultura pop da década de 80. E se passaram os últimos 30 anos a ouvir bandas como Nuclear Assault, Anthrax, Hirax, Exodus, Vio-Lence, Cryptic Slaughter, D.R.I., Municipal Waste, e por aí fora, então nada nas músicas soou muito inesperado e muitos dos padrões de guitarra rítmica são previsíveis. O que sucede é que os austríacos são suficientemente explosivos na sua velocidade rítmica, extremamente robustos nos seus riffs e capazes de lançar ganchos melódicos que abrem um sorriso a qualquer um. O guitarrista original Dave the Grave of Death não tem alinhado nas datas desta digressão, mas Inphiltrator revelou-se um autêntico shredder, assumindo todo o corpo harmónico das guitarras e com os solos a soarem ainda mais vigorosos do que nos registos em estúdio. A juntar a tudo isto, Heavy Kevy foi um frontman absolutamente maníaco, queixando-se amiúde da dificuldade em encontrar drogas, nomeadamente cocaína (o que duvidamos, dada a sua prestação), da dor oriunda de fissuras anais derivadas de diarreia constante provocada por francesinhas (o que valeu um improviso rap) e da dificuldade em esvaziar os intestinos após ter comido bananas ao pequeno-almoço, procurando solucionar o problema anterior. Evocou maneirismos de Axl Rose, e mostrou-se igualmente capaz de exibir-se vocalmente no splatter thrash ou através de gang vocals. Foi divertido, histérico, intenso e genuíno. Parafraseando um dos seus monólogos com o público, há a merda de uma guerra no continente europeu, há crises sociais e na habitação em todos os países, a economia está de pantanas e não se arranja droga em lado nenhum. A meio deste caos que o mundo se tornou: Why Is David Guetta Still Alive? Um malhão de crossover, divertidamente político e um dos momentos altos do concerto. Tal como os bangers «Arac Attack», «Kill Yourself» (original dos S.O.D.) e «Metal Punx Never Die» – encerrado com um simulacro do fade out de «Don’t Cry». Mas nenhuma malha bateu mais no público que a (semi-)versão dos Maiden, colocando toda a gente a berrar “Run to the pit, mosh for your life”. Foi o concerto de estreia dos Insanity Alert no nosso país (super zelas style) e mal podemos esperar pelo próximo. [N.]


Menção Honrosa: ROTTEN SOUND

foto: Rotten Sound

Há mais de três décadas alguém arranjou um lugar no Guinness Book of World Records para os Napalm Death por terem escrito a canção mais curta do mundo. Chama-se «You Suffer» e, na altura, apresentava algum do “ruído” mais infernal alguma vez registado em vinil. Abriu-se ali o caminho para um género, o grind, replicado e extremizado vezes incontáveis desde então. De há umas décadas a esta parte, estes finlandeses transformaram-se numa das propostas mais interessantes saídas da segunda geração da tendência e, com várias passagens por Portugal, são já bem conhecidos pelo público do SWR – onde voltaram este ano, com novo álbum da bagagem, o corrosivo «Apocalypse», para fecharem com chave de ouro as actividades no palco principal. Não é crível que alguém ali estivesse à espera de nenhuma revolução porque, quando toca a estes dudes, não há que enganar – o que servem é uma descarga de proporções colossais. E sim, são daquelas bandas cujo apelo nunca ninguém na casa dos 40 anos vai conseguir explicar aos seus pais, mas para quem está por dentro, não há melhor “castanhada”. Com os pés bem firmes em terreno testado e caminhado com sucesso, ainda assim há uma intensidade inabalável na amálgama de grind, crust e death metal enegrecido e grind que os Rotten Sound apresentam. A descarga atingiu com uma força tremenda a multidão, nesta altura a queimar os últimos cartuxos, com as crescentes ondas de som distorcido a inspirarem um headbanging espástico. Verdade seja dita, nesta ocasião tiveram o público na mão desde o primeiro momento, com o simpático Keijo Niinimaa – que, uns minutos antes, estava ali ao nosso lado na plateia a observar atentamente o tio Tom G. – a comandar as tropas com punho de ferro e um rugido impotente. Sem surpresas, dividiu-se entre gritos de rasgar a garganta e o seu característico grunhido grave, além de ter confirmado a ideia de que é um MC de excelência. Entre elogios ao SWR, mostrou-se grato por estar finalmente de volta e, claro, conquistou a simpatia dos presentes. Com um volume ensurdecedor, o quinteto cuspiu tema após tema de forma impiedosa, com as descargas de blastbeats pulverizantes, os grooves e som de guitarra à Entombed e o ocasional colapse sludge a propagarem ondas de caos pelo recinto. Com os dois temas iniciais, «Pacify» e «Equality», e mais uns quantos (como o single «Renewables») lá mais para a frente no setlist, forneceram uma representação variada do novo álbum, mas na verdade foram as canções mais antigas, como «Power», «Targets», ou «Slay», que atrairam os espectadores mais desordeiros para algo familiar. Apesar do tamanho do palco, mostraram-se cheios de energia, a tocar e a cambalear de um lado para o outro, num headbanging furioso. Cá em baixo, com o mosh pit ali a uns centimetros, a vibração não estava muito diferente, por isso quando o bom do Keijo diz que vão tocar “uma música para todos”, está tudo numa sintonia tão pouco provável que se percebe que não está a brincar. Isto é uma festa grindcore e todos estavam convidados – no SWR compareceram em massa e, figurativamente, os Rotten Sound abalaram os alicerces da tenda. [J.M.R.]


Surpresa: MASTER BOOT RECORD

foto: Estefânia Silva

Mesmo para quem conhecia os discos e já estava ansioso por ver o que ia dar a bizarria destes italianos, não há como não ter ficado de queixo caído com a banda que fechou com chave digitalmente dourada o festival deste ano. Caso não saibam, a ideia por trás deste projecto é que se trata de um processador de um PC antigo (especificamente, um 486DX-33MHz-64MB) que supostamente gera a música toda, um híbrido de heavy metal com sintetizadores clássicos. Claro que só um nerd que foi ele próprio pirata informático nos anos 90 como Victor Love é que se lembraria disto, e só essa mesma cabecinha é que teria a ideia de montar em palco o estaminé como se da sua própria “área de trabalho” dessa altura se tratasse, com alguns computadores da época (um Commodore 64 e um Amiga) a projectarem constantemente cenas de jogos emblemáticos como acompanhamento, alternando com aquelas intros que os piratas que nos proporcionavam os jogos (vá lá, we all did it) deixavam nas disquetes. Só por aí, o concerto já foi uma vitória – era notório o reconhecimento de muitos dos presentes à medida que Lemmings, Ivan “Ironman” Stewart’s Super Off Road, Sensible Soccer, Strike Commander, The Secret Of Monkey Island, Zak McKracken And The Alien Mindbenders e tantos, tantos outros nos iam passando à frente. Vitória ainda antes da primeira nota tocada para determinado segmento do público, mas ainda havia tantas notas para tocar! Em particular, vindo dos dedos do novo membro da banda, o virtuoso e jovem guitarrista Edoardo Taddei, que deu um espectáculo de shredding como poucas vezes vimos, ainda por cima num contexto extremo deste género. Sem masturbações vazias, sempre com um propósito melódico, acompanhando na perfeição a chinfrineira digital que o maestro Victor vai armando com os seus ritmos e texturas sonoras (e uma nota para o baterista Giulio Galati, a fazer os possíveis por soar a uma caixa de ritmos ao melhor estilo de um Raymond Herrera), dá toda uma nova dimensão à música dos Master Boot Record. E não só! É que pelo meio dos seus temas, que já de si seriam suficientes para cativar o público pela riqueza composicional que apresentam – são mesmo catchy, não há outra descrição -, os MBR ainda se aventuram em versões de temas de alguns dos jogos mais marcantes da época que veneram, como que um rebuçadinho para a malta gamer se agarrar, e mais uma vez, foi notório o reconhecimento daquelas melodias por boa parte dos presentes. Tivemos direito a relembrar o ambiente do Doom (o que teve recepção mais efusiva, claro), do Golden Axe, do Castlevania, do Command & Conquer: Red Alert, e do inenarrável Duke Nukem, à laia de cerejas digitais codificadas no top de um bolo magnífico de nostalgia, virtuosismo, originalidade e boa disposição. Não imaginávamos melhor maneira de fechar o SWR, sinceramente. [J.C.S.]


Surpresa (menção honrosa): BLODKSAM

foto: Estefânia Silva

Ali meio perdido para o meio do cartaz, e igualmente posicionado a meio do último dia, estava um nome que não terá suscitado grandes reacções da maior parte do público – uns tais de Blodskam. Mesmo quem acompanha mais regularmente o underground do black metal poderá não ter totalmente ideia do trajecto destes suecos. Certamente terá passado ao lado de muitos que estávamos perante uma ocasião rara e bastante peculiar – ainda para mais de uma banda de um país com tradições firmes num dos géneros maiores da música extrema, fundada há mais de duas décadas. É que este concerto em Barroselas era… o seu primeiro! É verdade, tivemos a honra de testemunhar a primeira, e para já única, aparição em palco de uma entidade nebulosa, formada pelos irmãos Aghora e Dödfödd em 1998, mas que só na última década começou a dar sinais de verdadeira actividade. E que actividade – «Là-Bas» e «Ave Eva», de 2019 e 2022 respectivamente, são dois petardos de black metal old school, denso, fortíssimo, abrasivo e recheado de canções de elevado potencial, e foi precisamente essa a vibe que a banda nórdica transmitiu numa actuação potentíssima, sempre em crescendo, que começou com umas dúzias de curiosos em frente ao palco do Arena Stage e terminou com uma horda de devotos aos berros. O primeiro tema do tal primeiro álbum, intitulado «Bödel», teve um impacto particularmente visceral, com Dödfödd a arranhar o refrão marcante (“you are not my father / satan is my father!“) com uma convicção arrepiante. A cuspidela de sangue no final da actuação, para além de ter apanhado de surpresa alguns dos presentes nas filas da frente, foi como que a cruz invertida final espetada no coração de Jesus. Um daqueles concertos que quem decidiu ir ver vai dar muito valor à sua escolha nos próximos anos. [J.C.S.]


Produto Nacional: BLEEDING DISPLAY

foto: Estefânia Silva

Na noite anterior a subir ao palco grande do SWR, Sérgio Afonso, a voz e cara destes death metallers lisboetas, confessava o carinho que tem pela sua peregrinação anual a Barroselas, descrevendo um evento em que a fraternidade entre os presentes acaba por ter tanta (ou mais) importância do que as bandas que por ali passam. Efectivamente, depois dos anos de seca, essa gratidão parecia ser generalizada nesta edição de 2023 e os Bleeding Display conseguiram levar essa vibração para o palco com um engenho considerável. Mas já lá vamos. O quinteto é mais um dos que tem crescido e prosperado paralalelamente ao SWR, sendo que hoje se afirma como uma das propostas mais sólidas e intríncadas que temos dentro do género por cá.  Após a estreia «Ways To End», de 2006, e um muito mais evoluído «Deviance», em 2014, o quinteto esteve sem gravar durante quase uma década para, em 2022, voltar à carga com uma formação renovada – agora com a dupla Samuel Trindade e João Jacinto no lugar do fundador João Ferreira – e um disco que deixou toda a gente de queixo caído. «Dawn Of A Killer» não só não desiludiu como solidificou o rolo compressor em que estão transformados, com esta actuação a reiterar isso in the flesh. Sujos de sangue, com Sérgio a brandir um machado enorme – piscadelas de olho ao conceito em torno dos serial killers que premeia o regresso às edições – e apoiados no som forte e equilibrado (que caracterizou todas as actuações neste palco), estavam reunidas as condições necessárias para protagoniram um festim de brutal death metal carregado de proficiência técnica. Certo, certo; é exactamente a isso que nos têm habituado desde o primeiro dia, mas agora estão mais refinados. Apoiados em temas mais recentes como «The Nightstalker», «The Skin», «Green River Killing» ou, já na recta final, «213»,  mas nunca esquecendo o fundo de catálogo, os músicos debitaram tema após tema a um ritmo devastador e revelaram ter na manga cada vez mais opções de requinte na forma como procedem ao homicídio sónico. Uma delas, e a mais cortês de todas, foi uma versão demolidora da «Cadant In Obscurum», original dos Goldenpyre, a proverbial “banda da casa”, com direito a dedicatória sentida e toda a gente a concordar que sim, esteve é daqueles eventos a que damos graças anos após ano. [J.M.R.]


Produto Nacional (menção honrosa): Holocausto Canibal

foto: Marta Rebelo

O demolidor concerto dos HOLOCAUSTO CANIBAL neste SWR 23 não foi propriamente uma surpresa. Foi a confirmação de aquilo em que a banda se tem vindo a tornar, particularmente nos últimos cinco ou seis anos: uma avassaladora e horrífica máquina de brutalidade sónica. Arrancaram com um segmento integral e sequencialmente dedicado ao mais recente disco. Com uma secção rítmica sem compromissos na brutalidade e com maior agilidade ou um sentido mais directo no groove, as linhas de guitarra de António C. preenchiam os ténues espaços livres com um balanço mais Brutal Truth (na era «End Time») – embora sem os pinch harmonics e numa orientação mais punk. Ainda assim, talvez o único pecado do concerto tenha sido alguma falta de robustez low end da guitarra e baixo. Carácter do PA ou do rig de António C. e Z. Pedro, fica a questão. Mas, numa analogia com o tão amado cinema gore dos Holocausto, fomos crudemente perfurados, mas nunca chegou o esmagamento opressivo. Alheio a tudo isto, Diogo P. destratou qualquer snobismo e “nove horas” de considerações meta-musicais com uma enxurrada de porrada de blasts e d-beat, servindo de barómetro para a fusão do primeiro segmento do concerto com aquele em que a banda começou a introduzir «Gorefilia» (2012) e outros registos mais vetustos ao alinhamento. Queira-se ou não, ao ouvir «Lactofilia Destalhada» é impossível não invocar mentalmente as formas “willendórficas” da protagonista do vídeo. Quando uma banda consegue criar sinestesias espontaneamente, alguma coisa estará a ser bem feita. Até ao fim, intensidade visceral fizeram suceder estouros como o rock ‘n’ roller «Campas do Negro Breu», o clássico «Violada Pela Motoserra», a actual jóia da coroa, «Quérolo dos Finados», e o borderline d-beat de «Sortilégio da Perversão». Não foi o melhor, nem o pior concerto dos Holocausto, foi mais um dentro do brutal padrão a que a banda nos habituou. [N.]


Desilusão: ESOTERIC

Longe de nós “bater” indiscriminadamente nos ESOTERIC, para começar. Estas categorias da “desilusão” que decidimos usar este ano têm como objectivo primordial dar a entender que em todos os eventos deste género há sempre coisas que funcionam melhor que outras, e não se trata necessariamente de uma má prestação – que também as há, e é preciso encarar com naturalidade. Mas sim, muitas vezes a “culpa” de um tiro ao lado nem é das bandas, nem de ninguém, tem a ver com o fluir natural de acontecimentos, e foi um bocado isso que aconteceu com os britânicos. São uma das bandas mais importantes e mais invulgares do funeral doom/death, e já fomos esmagados pela lenta e pesadíssima opressividade que são capazes de debitar em palco em várias ocasiões. Mas aqui, a atmosfera simplesmente não estava lá. Nem terá sido o facto de terem ficado sem baterista à última da hora que terá contribuído para o facto, foi mais o contexto em que tocaram – logo a seguir aos Triumph Of Death, sinceramente, a vontade de ir mastigar malhas de dez minutos com necessidade de atenção ininterrupta para entrarmos na cadência hipnótica dos riffs paquidérmicos, era quase nula. O palco Arena também não é propriamente o espaço ideal para esta banda, com o som a dispersar-se um pouco, e para juntar à (ausência de) festa, muita gente aproveitou o final de uma sequência imperdível de concertos para finalmente ir jantar, o que deixou o espaço com um aspecto próximo do desolador, principalmente em comparação com o que foi costume durante todo o fim de semana. Quem se borrifou nisto tudo e investiu a sério no concerto, certamente terá dado o seu tempo por bem entregue. Mas no geral, os Esoteric passaram por Barroselas sem, desta vez, ter deixado grande mossa. Fica para a próxima. [J.C.S.]