Xxxapada Na Tromba @ RCA Club, Lisboa | Dia 1 – 20.01.23 [reportagem]

Finalmente. o regresso do mítico Xxxapada na Tromba, depois de dois anos em que o evento não se realizou pelas razões que todos conhecemos. Mais que a fome de voltar por parte de bandas, organização e público, há também o factor da saudade antecipada, já que esta edição foi anunciada como sendo a última — pelo menos nos moldes actuais, algo que a própria organização ainda não decidiu. Como tal, obviamente que a LOUD! esteve presente no desfilar de música extrema que esgotou no decorrer deste primeiro dia. Depois do cancelamento da presença dos ANIME TORMENT, e com a impossibilidade encontrar uma substituição, foi dada a indicação de que todas as bandas teriam direito a mais tempo de actuação, de forma a que o evento terminasse às horas previamente estabelecidas. A preocupação com os horários foi, de resto, um dos pontos alvo de atenção. A esperada animação começou então com um dos nomes mais ansiados do cartaz, os britânicos BASEMENT TORTURE KILLINGS, que iniciaram a matança frente a uma sala ainda despida de público (afinal eram 18:00 de uma sexta-feira) mas a situação foi-se alterando conforme a actuação da banda foi avançando. Beryl tem sempre aquele encanto macabro, seja pelo paradoxo da sua presença, diabolicamente angelical, seja pelo vozeirão que evoca em temas como «Erotophonophilia». O aspecto teatral das suas actuações também é sempre um ponto alto, com o já tradicional desmembramento e estripamento do urso de peluche — com direito a vísceras de porco para serem passadas ao público. Seguiram-se os italianos RABID DOGS, que nos foram apresentados como mestres do grind’n’roll, uma descrição que assenta perfeitamente naquilo que fazem. Estilo gingão, som cheio de gravilha a lembrar os melhores momentos dos Entombed e pura diversão death/grind. Ah, e uma harmónica que só pecou por não ser mais audível no meio de toda a brutalidade. Foi o momento perfeito para se ensaiar o belo do headbanging. Antes do jantar, totalmente apropriado para abrir o apetite, subiram ao palco os DEAD MEAT. A banda de Castelo Branco continua a ser uma aposta segura em termos de brutalidade, e esteve particularmente eficaz. O EP «Unleash The Gore» esteve em destaque e o público ficou completamente possesso com as rendições de «Killing Mode» e «I’m The Reaper» na primeira actuação a provocar real impacto no público com o mosh, os stage dives e os crowd surfs a sucederem-se em catadupa. Um dos concertos da noite.

Depois de uma rápida hora para jantar, não havia descanso para os malvados. Para abrir a segunda parte da noite, foram escolhidos os DOWNFALL OF MANKIND. A banda de Sérgio Páscoa e Lucas Bishop dispensa apresentações, basta dizer que têm sido incansáveis nos últimos tempos — seja em concertos divididos entre Portugal e pontos estratégicos na Europa seja a soltar nova música. O mais recente single, «God Of Nothingness», soou ainda mais demolidor em palco que em estúdio. Lucas esteve imparável como já habitual, saltando para o público para manter as hostes activas e até para abrir uma wall of death, com o seu deathcore sinfónico a ser recebido de forma muito efusiva. A brutalidade não ficaria por aqui, claro. Os franceses EMBRACE YOUR PUNISHMENT deram um enorme concerto, em que o seu brutal death metal não deu tréguas com temas como «Black Storm», «Alone In This Pit» e «Masters Of Hate» mostraram todo o seu poder. O público, esse, estava completamente em brasa — tendo inclusivamente subido um fã ao palco com a prótese da sua perna na mão, aos saltos. Também foi aqui que tivemos um cheirinho do que viria a seguir, com Lukas Swiaczny, dos STILLBIRTH, a ser convidado a cantar um tema. Um cheirinho bom, já que os STILLBIRTH também não deram tréguas, registando-se mais uma wall of death, mais um vocalista convidado (desta feita Lucas Bishop) e mais uma colecção de malhões de brutal death metal que não deixou ninguém indiferente. Não só foi impressionante reparar nos níveis de intensidade que a banda conseguiu atingir, como também na resistência e energia do público.

Da República Checa vieram os JIG-AI, a primeira proposta assumidamente grind desta noite. Percebemos que, com eles, as descargas curtas e brutais vêm sempre em pares (ou triplas) para garantir que  não há perdas de energia. No entanto, mesmo que assim não fosse, este power trio não iria deixar que o marasmo se instalasse. Se Buraak, baixista e vocalista, é mais estático na presença de palco, já o guitarrista Brain é um autêntico dínamo, dando resposta à pergunta inquietante que ninguém fez que é “como seria se o Barney dos Napalm Death fosse guitarrista?“. Só temos um reparo– a falta de dinâmica vocal de Buraak fez sentir que, apesar de musicalmente haver diferenças óbvias entre os temas, as linhas de voz pareciam invariavelmente as mesmas, exceptuando pelo registo gritado ocasional ou pela intervenção de Brain, também ela ocasional. Nada que afectasse a recepção da banda, contudo. Apesar dos problemas técnicos que cortaram o fluir da actuação dos ABYSMAL TORMENT, a banda de Malta também manteve o nível elevado, mas por esta altura o cansaço já começava a falar mais alto, com parte do público a desmobilizar. De qualquer forma, isso não impediu uma acutilância violenta que permitiu até apresentar um novo e promissor tema, «Vermin», apresentado em exclusivo no Xxxpada. Pena foi que não percebéssemos muito bem se o vocalista estava a falar a sua língua natal ou em inglês, a não ser quando dizia alegremente “Muito obrigado“. Na recta final, e após mais uma debandada, ainda tocaram os CEREBRAL EFFUSION. Tiveram uma forte base de apoiantes, de tal forma que até parecia que estavam a jogar em casa e não no país vizinho. Apesar do entusiasmo, a sua fórmula de brutal death metal não conseguiu impressionar, ainda que tivess havido momentos de interesse, como o destaque a «Ominous Flesh Discipline». Foi com eles que acabou a primeira noite de festa e, depois de um castigo épico, era tempo de recolher e recuperar forças em tempo recorde para voltar para a segunda dose.

Fotos: Sónia Ferreira