ROYAL THUNDER – entrevista exclusiva

Os Royal Thunder são uma banda especial – tão especial que elegemos o seu novo «Crooked Doors» como o nosso álbum do mês na LOUD! de Abril, e lhes dedicámos três páginas de uma entusiasmante entrevista. Podemos revelar que se trata de um dos discos mais unânimes dos últimos tempos na redacção da LOUD!, e um dos nossos favoritos do ano até agora, uma rockalhada como não ouvíamos há muito… e isto tudo, quase poeticamente, numa edição “encabeçada” pelos Led Zeppelin. Como preview do que podemos esperar no extenso artigo que fará parte das páginas do #169, aqui fica um excerto inédito da conversa que o José Almeida Ribeiro manteve com a frontwoman Mlny Parsonz, totalmente exclusivo ao nosso site.

Comparativamente ao «CVI», como dirias que soa este «Crooked Doors»»? Eu diria que parece um álbum de uma banda já bem firme e estabelecida…

Mlny: Estávamos com estados de espírito totalmente diferentes na altura em que fizemos o «CVI» e na altura em que compusemos o «Crooked Doors». O «CVI» foi uma espécie de jornada espiritual, em que nos libertámos de velhas associações com um culto cristão. Fomos nós a sair disso e a sentirmos uma certa revolta perante essa igreja. Foi uma época em que tivemos de lidar com essas emoções e com coisas que experienciámos quando fazíamos parte disso. Foram tempos mais negros e foi daí que adveio a escuridão e o peso desse disco. Com o «Crooked Doors» ainda existiam coisas que todos estávamos a passar, mas diria que é um tipo diferente de melancolia. Estou a crescer e sinto-me numa encruzilhada e existem uma série de conflitos interiores e de escolhas de vida que implicam deixar coisas para trás. Percebo quando dizes que soa a algo mais firme e estabelecido, mas por mais estranho que pareça, quando parámos para compor o disco sentimos pânico. No entanto, acabou por ser um processo muito relaxado e controlado.

 

Que portas enviesadas são estas de que falas no tipo título do disco e o que representam?

O título surgiu num dia em que estávamos em tour e nos perdemos. A certa altura, depois de muitas voltas, olhamos para a esquerda e vemos um par de portas enviesadas. Pensámos, “uau, portas enviesadas, isto é esquisito, estes gajos conseguiram mesmo lixar isto” (risos). E depois bateu-nos: “Isto é um bom nome para um álbum. Temos de nos lembrar disto”. Isso já foi há dois anos. É simbólico, entendes, normalmente ao longo da vida entras em porta enviesadas que te levam a trilhos enviesados e tens de te esforçar e fazer escolhas para encontrares o teu caminho. Tem a ver com as tais decisões.

 

Tens ascendência espanhola por parte da tua mãe e – posso estar a sonhar – no tema «The Line» algo me lembra flamenco. Podes chamar-me maluco à vontade (risos)…

[risos] Acho que sei do que estás a falar e acho que também ouço uns riffs na «Floor» que podem ter esse travo. Acho que é do Josh [Weaver, guitarrista, principal compositor e companheiro da Mlny] passar demasiado tempo comigo [risos]. Ele é all over the place com as suas influências musicais e é tão criativo… Ontem à noite estávamos a conviver um pouco na nossa sala, depois do ensaio, e ele estava sentado na cadeira ao meu lado a beber algo e estava a murmurar. Perguntei-lhe, “o que estás a fazer?”, e ele disse,“estou a compor uma música…”. Ele ouve todo o tipo de discos, cenas como Gipsy Violins, uma data de música latino-americana, portanto é bem possível.

 

Temas como «Wake Up» ou «Floor» fogem ao que se poderia, à partida, esperar de vocês. Quiseram propositadamente explorar novos terrenos ou simplesmente saiu assim?

Absolutamente natural, a sério. Tipo, “olha uma canção”. Era tão espontâneo como isto. Nada pensado, nem pré-concebido. Nunca nos sentamos e pensamos em ser um determinado tipo de banda ou fazer um determinado tipo de som. Nunca fizemos isso.

 

Imaginas-te a fazer alguma coisa diferente?

Já tentei. A uma certa altura queria ser professora de história, noutro ponderei ser cozinheira, mas desde miúda que me lembro que esta foi a minha escolha, era isto que queria. Amo viajar, adoro não ter planos, com excepção dos que dizem respeito à banda. “Aparece a esta hora, no palco X, para tocares”. Isto é máximo de planeamento que consigo ter na minha vida. Sou um espírito livre e portanto acho que este estilo de vida se adequa totalmente à minha personalidade. Além disso, sempre senti que nasci para fazer música.

 

O vosso baterista original definia-vos como “post apocalyptic blues” e sei que subscrevias essa designação. Achas que ainda serve para vos definir?

Acho que já não. De todo. O «CVI» tinha esse feeling mas o «Crooked Doors» é mais como labirintos que vão dar a locais de vegetação abundante, um pouco a ideia que está presente na capa do disco. É algo ambíguo, eu sei, mas é como um novo começo, não tem a ver com morte. É uma espécie de tempestade da alma, como se um tornado pegasse em tudo o que está cá dentro e o cuspisse para fora… Soa meio maluco, mas é como vejo, portanto não, post apocalyptic blues já não serve [risos].

 

Li uma entrevista onde dizias que consegues sentir o metal na música dos Royal Thunder, mas não o consegues ouvir. Explicas-nos isso?

É verdade. Vimos do metal. É como ouvir Emperor e Beethoven. Tu consegues ouvir metal em Beethoven ou mesmo em algum blues. Para mim, o sentimento que tens quando ouves metal é seres engolido, ficas enjaulado ali dentro, comprimido, mas de uma maneira boa. É algo que te consome e ao mesmo te faz explodir. É tão intenso. Sentia isso quando tocava black metal. Sinto isso quando ouço aquele blues pesado. Aquele peso na alma.

 

No seio da banda vocês sempre tiveram um lema: “Aconteça o que acontecer, fazemos isto por nós, não é por mais ninguém, por isso é 100 por cento a cada noite, independentemente de quem estiver a ver”. Mantêm esse espírito?

Sem dúvida. Tem a ver com quem somos, com o que fazemos, é a fundação para nós. Mesmo quando ninguém está a ver, damos 100 por cento sempre que tocamos. Fartamo-nos de suar na sala de ensaios. Quando tocamos música não é fingido, é uma expressão de quem somos, e não somos pessoas plásticas, somos um grupo de gente genuína. Já tocámos para menos de 50 pessoas e, de repente, dou por mim a pensar: “Oh meu deus, vou tocar no Hellfest, vou borrar as cuecas, vou-me esquecer das notas e das letras, provavelmente vou morrer em palco!” Depois, chego lá e percebo que não faz diferença nenhuma. Não sinto nada de diferente. Para um ou um milhão, fecho os olhos e vou até àquele sítio onde vou sempre. Nunca estivemos em competição com ninguém, não prestamos atenção a mais nada e fazemos o que fazemos com toda a nossa alma. Porque se não tivermos isto, sinto que vamos morrer. [risos] Somos músicos/artistas esquisitos criativamente e isto é o que sabemos fazer, o que amamos fazer.

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